quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Os Abas Largas

Os Abas Largas

                                                                                  (*)Moisés Silveira de Menezes

               Ao final dos prazerosos e inquietantes oitenta e três minutos dedicados a assistir o filme “Os Abas Largas”, nos deparamos com a célebre, velha, sempre atual e insofismável afirmação de Oscar Wilde: "A vida imita a arte muito mais do que a arte imita a vida."
   Não vamos nos aprofundar nessa sentença porque ficaríamos dias e noitesenvolvidos com situações que ora ilustram que a vida imita a arte e ora demonstram o contrário, mas no filme em questão nos deparamos com as duas assertivas dependendo do ângulo que se analisa.
 A frase de Wilde imbrica também na discussão sobre ficção e realidade que permeia qualquer análise que se queira fazer quando se comenta a arte nas suas mais variadas manifestações e, no momento, me vem à memória a resposta que me deu Victor Aquino, professor da Escola de Comunicação e Arte da Universidade de São Paulo, a um questionamento que lhe fiz:
            “-Toda realidade é fantástica. A fantasia, muitas vezes, também é real. Importante é a descrição. Embora fato real utilizado em texto ficcional, ou vice-versa, tudo pode derivar em dúvida. Exemplos: primeira missa na Ilha de Santa Cruz, os escritos na areia do padre Anchieta, o amor de Marília por Dirceu, a execução de Tiradentes, o papel de Garibaldi na guerra dos dez anos (ou guerra do charque, ou guerra contra o império), a descrição de qualquer herói (seja na Grécia clássica, seja na guerra do Paraguai) e assim por diante. Enquanto isso, a dúvida, que nem sempre é dúvida, mas o desalinho entre tudo que é real e alguma coisa que é ficção, muitas vezes pode remeter ao mito ou a uma elaboração mitológica. Contudo, o que importa, mesmo, é a inteligência de quem escreve de quem dispõe do mando da autoria domesmo, é a inteligência de quem escreve de quem dispõe do mando da autoria do que se cria em literatura.”
          Na senda dessas assertivas, o filme tem cenas que nada mais são do que o transpasse para a tela do dia a dia do Regimento de Polícia Rural Montada: despachos do comandante, formaturas, expulsão de um integrante que comprovadamente aderira ao crime, também com alguns integrantes do Regimento desempenhando seu próprio papel ou sua própria atividade em seu cenário de rotina, como o caso do próprio comandante da unidade e alguns auxiliares diretos, confirmando o que disseram Oscar Wilde e Victor Aquino há uma dose de ficção,um pouco de arte e assim nos parece que a vida se vale ,reproduz ou imita pelo menos em parte esse contexto ficção\realidade.
               Por outro lado, os atores encarnam com tal originalidade, espontaneidade e doação seus papéis que, ao observador mais desavisado, será muito difícil saber quem é integrante do Regimento no exercício de sua atividade, fazendo seu próprio papel, e quem, ator por excelência, está corporificando uma personagem e, entre muitos, cito o ator e poeta Dimas Costa irrepreensível na construção da personagem Sgt.Nicácio que, transitando entre um ser divertido, bonachão e profissional, nos lembra muito os velhos “rurais” que conhecemos, haja vista a convivência muito próxima que tivemos com a legendária “rural montada”, por ser filho de um desses abnegados que fizeram história pelos fundões do Rio Grande e, bem mais tarde, por ter tido a honra de comandar a renomada unidade, no entanto renomeada com a supressão da palavra “rural”

                   Ao analisarmos um filme devemos ter em mente que esse não é um texto, mas se compõe de vários textos simultâneos representados pelo roteiro (muitas vezes considerado como o único texto de um filme), pela iluminação, pelo guarda-roupa, pela trilha sonora e a fotografia. Da maior ou menor capacidade de tais múltiplos textos conversarem coerentemente entre si dependem de maneira significativa a beleza e harmonia do filme. Nesse sentido, qualquer trabalho com o cinema exige a observação detalhada de todos esses textos superpostos e simultâneos, ultrapassando em muito a análise do roteiro expresso nas falas dos personagens em cena. 
                     Um enredo romântico, com belas atrizes e indefectíveis mocinhos, tudo muito fiel ao gosto da época, permeia de forma subjacente o conflito principal que reproduz a eterna e universal luta do bem contra o mal,do justiceiro honrado no combate ao crime.O filme se completa nesses dois aspectos do enredo com um agradável desenvolvimento e com muita qualidade,principalmente se levarmos em conta a época com as visíveis dificuldades para levar-se a cabo um empreendimento de envergadura em uma arte que havia começado a pouco mais de cinquenta anos, na Europa, e que ainda engatinhava na terra da pampa larga.
               “Os Abas Largas” foi apresentado à época como o primeiro far west brasileiro porque se insere no contexto da vida rural rio-grandense bastante similar ao oeste americano.Por lá e aqui, nos pagos em torno da lida e dos negócios gerados pelo boi e o cavalo, criou-se alguns tipos sociais únicos e bem definidos:peões,tropeiros,fazendeiros,domadores, ladrões de gado,receptadores(esses dois últimos popularizados pela expressão “abigeatário”).Na realidade,a obra é bem mais que um simples far west brasileiro,pois reproduz, com arte, a vida do interior do estado nos anos 50-60,com seus conflitos,seus encantos, suas peculiaridades,suas belezas e suas tristezas.Além disso fica bem visível que a obra possui um ótimo diálogo entre seus variados textos com destaque  especial para roteiro,fotografia e figurino.
                Se o estereótipo do gaúcho, lidador, campeiro, criador de gado não rivaliza com o vigor, com a miticidade, com o ar lendário de um personagem de Hernandez, de Sarmiento ou de Güiraldes, provavelmente porque a nossa literatura não tenha criado nada que se aproxime de Martim Fierro, Dom Segundo Sombra ou Facundo,no entanto, na tela, desfilam gaúchos desmistificados,em carne e osso,com virtudes e defeitos e por isso  humanos.Uns envergando a farda da recém criada Rural Montada,menina dos olhos da Brigada Militar, junto com os Pedro e Paulo(os Rurais para o interior do estado,e os Pedro e Paulo para a área urbana), e outros, ainda, na labuta diária da vida de campo,o pastoreio,a tropa e suas decorrências, peculiaridades e singularidades e é nessa reprodução do gaúcho daquele momento histórico,pois, a obra não vai ao passado mítico,que a arte mais se aproxima da vida e vice versa.
                 Existe uma linha muito tênue que separa o bem e o mal, o certo do errado, a polícia do mundo do crime. Cruzar essa linha não é tão difícil quanto se pensa. Quando o bem, representado pelo agente da lei ultrapassa essa linha, a sociedade passa a não ter parâmetros e, ao lembrarmos-nos do livro do Gênesis, a polícia pode ser interpretada como criação de Deus, pois, a  figura anjo com a espada flamejante de certa forma representa uma primitiva idéia de  policial.
                 No filme que ora se comenta, esse conflito antagônico se desenvolve em primeiro plano com o agravante de que um rural também ultrapassa essa invisível fronteira e apresenta uma faceta que é real até os nossos dias, qual seja,um chefe da quadrilha,bandoleiro que não se encaixa no conceito do desajustado social,do homem criado à margem da sociedade e por isso já em conflito com essa desde o nascimento.O abigeatário chefe,receptador, é fazendeiro e doutor,cidadão, a princípio, livre de quaisquer suspeitas, com álibis naturais que a posição social concede e com isso bem difícil e complexa se torna a ação da lei para a comprovação do crime e da consequente punição.
                 Esse fato de relevância no enredo, me lembra uma cena, lá dos anos 60, quando meu pai e outro companheiro do 1º R.P.R. Mont.,a popular Rural Montada, investigando um roubo de gado acabou, ao  final de vários dias de trabalho árduo e competente, prendendo o mandante do roubo,figura bem conhecida na localidade,com futuro político pela frente e de imagem irretorquível até aquela data (meados da década de 60).Quando chegaram na delegacia de polícia com o preso,o delegado saiu pela porta dos fundos e não voltou para o flagrante,tal a importância do preso no cenário local.O jeito foi aproveitar a abnegação e o desassombro de um escrivão de polícia e montar o flagrante fora da delegacia e depois levar o culpado e a documentação para um delegado conhecido de Santa Maria que fez a autuação.
                  Importante destacar, no filme, a punição do rural que trocou de lado - de agente da lei para criminoso-, pois essa forma de agir, sem corporativismo, sem protecionismo, rápida, justa e adequada à falta cometida, fez da Brigada Militar uma referência quando se trata de segurança pública e do permanente e acurado cuidado com  a honradez e dignidade de seus quadros,com a ressalva que, na atualidade, apenas houve uma adaptação às modificações da legislação penal com maior abrangência no que concerne aos direitos de ampla defesa ao faltoso.
                   O Rio Grande do Sul, pela faina do gado e suas derivações como atividade econômica principal, possibilitou o surgimento e abrigou os mais diversos personagens, entre matreiros, bandoleiros ou simples gaudérios. Esses tipos sociais sobreviveram ao tempo, permaneceram na literatura oral e no imaginário popular, que lhes acrescentou colorido de lenda e aura sobrenatural. Além disso, ficaram projetados no tempo, a espera de alguém que, um dia, os resgatassem para perpetuação e estudo de tipos sociais que vão desaparecendo.
                 Assim, figuras como Talco Cardoso, Ranchão, Martim Aquino e Locatelli, entre outros, resgatados na obra “Os Últimos Bandoleiros a Cavalo”, de Sejanes Dorneles, também não deixam de estar presentes no filme “Os Abas Largas”,no plano metafórico,embora a falta de uma cena de impacto,verídica, como aquela protagonizada por Talco Cardoso logo que saiu da cadeia do gasômetro em Porto Alegre narrada por Celito de Grandi:
                “... Comprou passagem no luxuoso “Minuano” e, ao chegar próximo à parada Inhatiun, para não descer em São Gabriel, temeroso de alguma cilada, obrigou o chefe do trem a brecá-lo nos trilhos, sob a mira de um revólver e o olhar espantado dos passageiros.Ali o esperavam os comparsas,com um cavalo encilhado...”
               Mesmo sem a presença dessa cena, real, quase irreal de tão real, o filme registra uma época importante no nosso processo histórico, pois, o campo bem mais que um modo de vida, tornou-se uma das principais atividades da nossa economia e que sobremaneira, colaborou com a mitificação do gaúcho e sua consequente permanência, com as nuances características que o tempo e o imaginário popular concedem àqueles ou àquilo que resiste ao primeiro e que, por alguma razão ainda não bem definida, caem no agrado e no gosto do segundo.
             Também se faz importante registrar que a obra cinematográfica pereniza e faz jus a uma das mais históricas unidades da Brigada Militar em um novo momento de sua brilhante caminhada. Trajetória iniciada em 93, no rastro dos Federalistas de Joca Tavares e Gomercindo Saraiva e, ensarilhando as armas, principiava a odisseia do policiamento ostensivo, levando paz e tranquilidade aos fundos de campo, nos grotões esquecidos, com missões que a tornariam pioneira do que, hoje, se define como Polícia Comunitária e Polícia Ambiental, quais sejam:

- a vigilância preventiva e as primeiras providências de caráter repressivo no interior dos municípios, em colaboração com a autoridade policial;
- execução de atividades educativas, advertindo e orientando, no cumprimento da legislação vigente;
- visitas periódicas a lugares remotos para entrega de correspondência e prestação de serviços assistenciais;
- auxílio a moradores de regiões mais isoladas, em caso de acidente ou moléstia;
- solicitação de médicos ou medicamentos, pelo rádio ou outros meios de comunicação;
- condução dos médicos, enfermeiros, parteiras, veterinários ou medicamentos para regiões de difícil acesso, em caso de necessidade;
- aviso às autoridades sanitárias em caso de epidemia, colaborando quando requisitado;
- assistência e auxílio à população flagelada, em caso de calamidade pública;
- medidas preventivas contra o fogo e combate a incêndios em matas;
- auxílio nos serviços florestal, caça e pesca de estatística e de proteção aos índios.

(*)Cel RR da Brigada Militar
    Graduado em Letras-Português-Espanhol

Bibliografia
-Aquino, Victor Prof. Entrevista virtual,facebook,2014.
-De Grandi, Celito.Jornal Zero Hora, domingo,15 de julho de2012.
-Güiraldes, Ricardo.Don Segundo Sombra, segunda edición, San Antonio de Areco, Proa, 1926.
-Hernandez, Jose. El Gaucho Martim Fierro, primera edición, Buenos Aires, Imprenta de La Pampa, Victoria 79, 1872.
-Mariante, HélioMoro.Crônicas da Brigada Militar,Imprensa Oficial Editora,1972.
-Pereira, Maj Miguel. Esboço Histórico de a Brigada Militar, Oficinas Gráficas da Brigada Militar, 1950.
-Sarmiento, Domingos Faustino. Facundo ou Civilização e Barbárie, tradução Sérgio Alcides, Cosac Naify, 2010.
-Dorneles, Sejanes. Os Últimos Bandoleiros a Cavalo. Editora da UCS. 2001





quarta-feira, 24 de agosto de 2016

CAMINHANDO




CAMINHANDO
Moisés Silveira de Menezes

Ando por essas ruas
Por vezes tão familiares
Por outras estranhas são
Relicário de sombras

Nos conhecemos do princípio
Temos mais silêncios
Que diálogos

As ruas me perguntam como vou
Digo que vou indo

Não me perguntam
Como venho
Respondo que venho bem

Não me perguntam mais nada
Silencio só traz respostas
lembranças

Sigo caminhando...

 Caminhar

È lidar com as lembranças

terça-feira, 16 de agosto de 2016

6ª TERTÚLIA MAÇÔNICA DA POESIA - PREMIADOS


6ª TERTÚLIA MAÇÔNICA DA POESIA - PREMIADOS
No dia 13 de agosto, as 20 hs, no Teatro do Sesc (Av. Alberto Bins 665, Centro, em Porto Alegre).aconteceu a sexta edição da Tertúlia Maçônica da Poesia Crioula, festival de poemas inéditos para integrantes da Maçonaria, mas que também permite a participação de concorrentes não Maçons.
A Tertúlia Maçônica da Poesia Crioula é um evento poético promovido pela maçonaria do Grande Oriente do Rio Grande do Sul (GORGS) sob coordenação de seu Departamento de Cultura Tradicionalista, Piquete Fraternidade Gaúcha.
Tal festividade, devido a sua grandeza e importância no cenário cultural do Estado, através da Lei municipal nº 10.903, de 31 de maio de 2010, passou a fazer parte oficialmente do Calendário de Eventos da Cidade de Porto Alegre.
A Comissão Julgadora esteve composto por Adão Ondino Bueno,Wilson Tubino e Everton Ferreira que tiveram a árdua tarefa de selecionar os 10 poemas finalistas de um total de inscritos bem acima de 200 poemas e analisar os dez poemas que subiram ao palco com apresentações impecáveis para compor a premiação da noite.Encerrado o show do cantor Jader Leal, foram conhecidos os premiados no evento.
LINHA MAÇÔNICA
Primeiro Lugar: A Capela de Rosslyn
Autor: Moisés Menezes (Loja Remanso - São Pedro do Sul)
Declamador: Rodrigo Canani Medeiros (Loja Acácia da Arte Real Nº 50 - Florianópolis)
Amadrinhador: Henrique Arboitte Torrel de Bail (Loja Remanso - São Pedro do Sul)
Segundo Lugar Maçônica: Itaú
Autor: José Estivalet (Loja Adayr Paulo Modena, nº 245 - Porto Alegre)
Declamador: José Estivalet
Amadrinhador: Jader Leal (Loja Adayr Paulo Modena, nº 245 - Porto Alegre)
Terceiro Lugar: Uma Pedra em Meu Caminho
Autor: Luis Lopes de Souza (Loja Cavaleiros da Arte Real - Passo Fundo)
Declamador: Paulo Ricardo dos Santos (Cavaleiros da Arte Real - Passo Fundo)
Amadrinhador: Rodrigo Cavalheiro (Cavaleiros da Arte Real - Passo Fundo)
Melhor Intérprete: Paulo Ricardo dos Santos (Cavaleiros da Arte Real - Passo Fundo)
Poema: Uma Pedra em Meu Caminho
Melhor Amadrinhador: Henrique Arboite Torres de Bail (Loja Remanso - São Pedro do Sul)
Poema: A Capela de Rosslyn
Melhor Letra: Itaú
Autor: José Estivalet (Loja Adayr Paulo Modena, nº 245 - Porto Alegre)
Declamador: José Estivalet
Amadrinhador: Jader Leal (Loja Adayr Paulo Modena, nº 245 - Porto Alegre)
Melhor Tema Maçônico: A Capela de Rosslyn
Autor: Moisés Menezes (Loja Remanso - São Pedro do Sul)
Declamador: Rodrigo Canani Medeiros (Loja Acácia da Arte Real Nº 50 - Florianópolis)
Amadrinhador: Henrique Arboitte Torrel de Bail (Loja Remanso - São Pedro do Sul)
LINHA LIVRE / NÃO MAÇÔNICA
Primeiro Lugar: A Morte Envolta no Lenço
Autor: Rodrigo Bauer
Declamador: Pedro Junior da Fontoura
Amadrinhadores: Henrique Scholz/Paulinho Pires
Segundo Lugar: As Leis do Fundo de Campo
Autor: Paulo de Freitas Mendonça
Declamador: Paulo de Freitas Mendonça
Amadrinhador: Raul Quiroga
Terceiro Lugar: Herança de Guerra
Autor: Cândido Brasil
Declamador: Jair Silveira
Amadrinhadores: João Aquino/Maicon Euriques
Melhor Letra: As Leis do Fundo de Campo
Autor: Paulo de Freitas Mendonça
Declamador: Paulo de Freitas Mendonça
Amadrinhador: Raul Quiroga
Melhor Intérprete: Pedro Junior da Fotoura
Poema: A Morte Envolta Num Lenço
Melhor Amadrinhador: Raul Quiroga
Poema: As Leis do Fundo de Campo